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Tudo que nos acontece é espiritual ???


Há muitos anos, quando Okonkwo ainda era menino, seu pai, Unoka, fora consultar Agbala. Naquele tempo, a sacerdotisa era uma mulher de nome Chika. Estava cheia do poder de seu deus e era muito temida. Unoka ficou de pé diante dela e começou sua história.

— Todos os anos — disse ele, abatido — antes de colocar uma só semente na terra costumo sacrificar um galo a Ani, a deusa da terra. É a lei dos nossos pais. Também sacrifico um galo no altar de Ifejioku, o deus dos inhames. Limpo o mato e lhe toco fogo, quando está seco. Planto os inhames depois da primeira chuva e os escoro, quando as gavinhas novas começam a aparecer. Capino as ervas dani...

— Cale-se! — gritou a sacerdotisa, com uma voz terrível, que ecoava no escuro vazio. — Você não ofendeu nem os deuses nem seus ancestrais. E quando um homem está em paz com os deuses e com seus antepassados, sua colheita será boa ou má, conforme a força de seus braços. Você, Unoka, é conhecido em todo o clã pela fraqueza de seu machete e de sua enxada. Enquanto seus vizinhos vão com seus machados derrubar as matas virgens, você planta inhames nas terras exaustas, que não dão trabalho algum para limpar. Seus vizinhos cruzam sete rios para fazer seus roçados; você fica em casa e oferece sacrifícios por um solo cansado. Vá para casa e trabalhe como homem!

(Chinua Achibe)


O texto acima é tão evidente em sua mensagem que pouco ou quase nada pode ser dito para deixa-lo ainda mais claro em sua resposta à pergunta que serve como título desse texto. A parte em negrito não nos deixa nenhuma dúvida: "Nem tudo é espiritual".


O mundo se despedaça, para usar o título do livro de Achibe, os caminhos se fecham, tudo começa a dar errado e um sem número de infortúnios recaem sobre nossas cabeças quando e, somente quando, nossas escolhas contribuem para isso. Observem, não estou aqui defendendo nenhum tipo de existencialismo crônico que responsabiliza a pessoa por tudo que lhe sucede. Não é isso, de modo algum. Contudo, não possa deixar de ressaltar que temos participação ativa em quase todos os eventos que nos acontece, para o bem ou para mal. Não falo de um avião caindo sobre nossas cabeças, nem de adoecimentos inesperados e imprevisíveis. Falo de ações evitáveis, atitudes imprevidentes (imprevidente não é o mesmo que imprevisível, só para constar).


Um belo exemplo desses infortúnios (fruto de atitudes imprevidentes e bem previsíveis) aconteceu em 2019. Fui avisado por uma força superior e inerrante do tipo "ele falou hoje? Pode ter certeza, vai acontecer amanhã" (falo de Èṣù, é claro) de que eu não deveria seguir com algumas escolhas. Ao contrário, deveria ficar em casa e estudar. Deixe-me voltar um pouco para que a história fique mais clara.


Naquele momento de minha vida, sempre que eu perguntava algo sobre as coisas que desejava, Èṣù respondia: vai estudar. No caso, estudar era me debruçar sobre o oráculo (Ẹ̀rindínlógún). Ele me garantia (ainda garante e cumpre) que me daria todos os recursos para eu realizar a minha vida (meu propósito). A única orientação era que eu me dedicasse ao Ẹ̀rindínlógún (jogo de búzios, para quem não sabe ou não se lembra).


Pois eu, em minha infinita sabedoria emocional (contém ironia), ou por outras palavras, apoiado em minha teimosia, insisti num caminho que não me levava ao estudo. O resultado foi uma série de eventos perturbadores e profundamente dolorosos (dói até hoje). O mais interessante sobre eu ter "quebrado a cara" (por imprevidência ou teimosia, nunca por imprevisibilidade) é que nunca ouvi de Èṣù a famosa frase: eu te avisei!


Mas, eu sei que ele avisou. Não uma, não duas, mas inúmeras vezes Èṣù me avisou. Não só me avisou, como me mostrou evidências de que eu estava no caminho errado e ele estava (como sempre) certo.


Como podemos ver, eu estava bem com meus ancestrais; estava bem com meu Òrìṣà. Estava bem também com Èṣù e minha vida continuava boa (minha vida é sempre boa). Contudo, não estava bem com meu caminho (eu não estava no meu caminho) e consequentemente, não estava bem comigo. Ninguém fica bem quando está perdido e era assim que eu estava: Perdido!


Meu mundo estava em pedaços. Mas, Èṣù estava lá comigo. (veja o post Oriki fun Èṣù) Ainda bem, pois ele é aquele que faz o erro virar acerto, ou seja, não é porque erramos que precisamos pagar ou arder no mármore do inferno, como acreditam alguns. A paga já é as funestas consequências do erro. Estamos no mercado e o mercado é o mundo. Então, comprou? paga, vendeu? recebe. Resolve, segue em frente e vê se aprende:


Se Èṣù é capaz de matar um pássaro ontem com a pedra que atirou hoje, alterando, com esta ação atual, o que nós chamamos de passado, ele é bem capaz de se mover no futuro e nos avisar no presente.


Passado e futuro para Èṣù é sempre presente!


Olùkọ́ Bàbá Ọ̀nà



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